Pandemias de gripe

 

Olá caros ouvintes da Rádio Centre-Ville. Vocês se lembram da epidemia de Síndrome Respiratória Aguda, a SARS, que afetou Toronto em 2003? Foram milhões de dólares de prejuízos com turismo e outras indústrias, para não falar nas mais de 700 pessoas que morreram. Pois essa epidemia da SARS não foi nada perto de outra doença muito mais perigosa que ameaça se espalhar pelo mundo, uma espécie letal de gripe.

 

Claro que eu não estou falando da gripe comum, aquela que deixa você com nariz escorrendo e sem disposição por uma semana. O perigo é um tipo de gripe letal que surge regularmente, se espalhando pelo mundo e matando milhões de pessoas. A maior epidemia do século XX foi a gripe espanhola que apareceu em 1917, matando entre 20 e 40 milhões de pessoas, o que na época era mais ou menos 1% da população. De lá para cá houve outras epidemias menores em 1957 e 1968. Como é que esse tipo de gripe pode aparecer assim, do nada?

 

Na verdade não é do nada que ela aparece. Gripes são causadas por tipos diferentes de vírus: alguns se espalham mais facilmente, outros causam uma gripe mais forte ou mais fraca, outros só afetam aves por exemplo. Hoje em dia há centenas de milhões de aves criadas em cativeiro, e elas têm os seus próprios tipos de vírus causando gripes. Os vírus  sofrem mutações, vão mudando de geração em geração. Mas como cada geração dura poucas horas ou dias e os vírus trocam material genético entre si, muito rapidamente podem surgir vírus com características novas. Uma gripe letal para humanos aparece quando um vírus de ave sofre mutação e passa a afetar humanos também. Os nossos sistemas imunológicos não estão preparados para essa nova variedade de vírus, e por isso ela pode ser muito mais perigosa. Se esse vírus troca material com um vírus da gripe comum e passa a se espalhar pelo ar a gente tem as condições para uma pandemia, quer dizer, uma epidemia global de gripe.

 

Infelizmente, os especialistas parecem concordar que é só uma questão de tempo até uma nova pandemia de gripe. Primeiro, porque nunca criamos tantas aves ao mesmo tempo – as granjas são um grande reservatório de vírus de aves e tornam fácil para os vírus passarem das aves para humanos. Mas a razão mais importante é que milhares de pessoas todos os dias viajam de um continente pro outro de avião. A gente viu o efeito dessa mobilidade durante a epidemia de SARS, que começou na China e rapidamente se espalhou por várias cidades do mundo.

 

Desde 1997 tem havido epidemias de gripe em aves na Ásia, e alguns tipos de vírus já passaram para pessoas, resultando em mais de 50 mortes confirmadas, o que é um mal sinal. Quando tivermos outra pandemia de gripe, levará meses até que os especialistas possam estudar o vírus e preparar grandes quantidades de vacina. Isso torna ainda mais importante acompanhar os novos casos e tentar conter a epidemia logo no começo. Esse acompanhamento de casos suspeitos têm sido complicado pois alguns dos países onde a nova epidemia tem mais chances de começar não colaboram abertamente com as informações, que é o caso da China e do Vietnã. No cenário mais otimista de uma pandemia os especialistas prevêm 30 milhões de pessoas de pessoas hospitalizadas e até 8 milhões de mortos. Além dessas mortes todas, haveria muitos outros problemas, pois muitos médicos, enfermeiras, e policiais por exemplo poderiam ficar doentes, o que poderia levar ao caos em certas regiões. Imaginem as previsões mais pessimistas...

 

É claro que a saúde mundial tem muitos outros problemas crônicos como as epidemias de Aids na África e malária em todo o mundo em desenvolvimento, que matam milhões de pessoas todos os anos. Doenças que afetam regiões distantes (e pobres) do mundo ou que são um perigo latente tendem a ter pouca prioridade no financiamento da pesquisa – uma situação muito triste, e ao mesmo tempo muito perigosa.

 

Ernesto Galvão, especialmente para a rádio Centre-Ville.

 

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Para saber mais:

 

1- Artigo no jornal The Guardian sobre um grupo de pesquisadores que estão alertando sobre os riscos de uma nova epidemia mundial de gripe:

http://www.guardian.co.uk/birdflu/0,14207,1131431,00.html

 

2- Informações no sítio do Center for Disease Control dos E.U.A.:

http://www.cdc.gov/flu/index.htm

 

3- Matéria sobre gripe na Scientific American Brasil (em português):

http://www2.uol.com.br/sciam/conteudo/materia/materia_67.html